Você e eu compartilhamos uma certeza absoluta: vamos morrer um dia. Aceitar essa verdade pode transformar seu dia a dia, ajudar a tomar melhores decisões e dar mais significado à sua existência.
Há três anos, meu amigo Tonin morreu em um acidente de moto.
Ele tinha 30 anos.
Num momento, ele estava voltando do trabalho para casa, provavelmente pensando nos planos que tinha com a namorada, e no momento seguinte, sua família estava planejando seu funeral.
Não pude comparecer e não conseguia acreditar no que tinha acontecido.
A verdade é que, seja aos 20, 30, 50 anos todos nós vivemos como se fôssemos imortais.
Deixamos de passar tempo com pessoas importantes.
Guardamos a viagem dos sonhos para quando tivermos “dinheiro suficiente”.
Perdemos tempo nas redes sociais, rolando o feed do instagram, com vídeos aleatórios no youtube e tik tok.
Adiamos nossos sonhos porque achamos que temos todo o tempo do mundo.
Que a morte só acontece com os idosos ou com outras pessoas, não conosco ou com pessoas próximas.
Mas a morte não espera. Ela não negocia. Ela não se importa com nossos planos incompletos ou palavras não ditas.
Não espera que você finalmente tenha coragem de pedir desculpas àquela pessoa que magoou há anos.
Não aguarda você criar coragem para mudar de carreira ou declarar seu amor por alguém.
Isso nos leva ao tópico de hoje: Memento Mori — a antiga prática estoica de lembrar que você vai morrer.
Antes que você feche esta página pensando que o tema é mórbido demais, peço que continue lendo. Esta pode ser a leitura mais importante para uma vida autêntica e significativa.
Por que evitamos pensar na morte
Pense na última vez que você pensou na morte. Você mudou rapidamente de pensamento? Procurou uma distração no celular? Ligou a TV? Foi trabalhar?
Tudo para evitar esse pensamento?
É compreensível. Isso é o que a maioria de nós faz.
Vivemos em um mundo construído para evitar a morte.
Gastamos dinheiro em cremes anti-idade prometendo “rejuvenescer 10 anos”. Falamos que alguém “partiu” em vez de “morreu”.
Durante anos, vivi assim também.
Fiquei 4 anos sem conversar direito com minha irmã mais velha por visões de mundo diferentes. Permaneci em um trabalho que não me realizava, que pagava pouco, me deixava estressada e doente, como se fosse a única opção.
Deixei momentos, sonhos, viagens e experiências para “quando as circunstâncias fossem perfeitas”.
Os filósofos estoicos, como Sêneca e Marco Aurélio, já entendiam há séculos: fugir de pensar na morte não enriquece a vida, na verdade, a empobrece drasticamente.
Como escreveu Sêneca: “Ninguém se preocupa em viver bem, mas em viver muito tempo, quando, na verdade, todos podem fazer a vida boa, mas ninguém pode torná-la longa.”
Como a consciência da morte transforma tudo
Vou fazer um compromisso público aqui.
A partir de hoje, vou praticar algo que os antigos filósofos estoicos faziam diariamente.
Toda manhã, assim que levantar, vou dedicar 3 minutos para imaginar que este pode ser meu último dia.
Não com medo ou tristeza, mas como um lembrete para viver com propósito as próximas horas do dia.
Como ensinou Sêneca, um dos grandes mestres do estoicismo, quando você para de fugir da morte e começa a usá-la como conselheira, várias transformações ocorrem:
Primeiro, sua percepção do tempo muda radicalmente. Em vez de rolar infinitamente pelas redes sociais, você começa a questionar como está investindo seu tempo.
Em vez de assistir a mais um episódio automático de uma série que nem gosta tanto, você pode pegar aquele livro que sempre quis ler ou ligar para alguém que ama.
Segundo, suas prioridades se tornam cristalinas.
Quando você internaliza que seu tempo é finito, começa a filtrar o essencial do banal. Você aprende a dizer “não” para o que não importa e “sim” para o que realmente tem valor.
Terceiro, e talvez mais surpreendente: você começa a apreciar mais profundamente a vida.
O café da manhã fica mais saboroso quando você reconhece que não terá um número infinito deles.
Os abraços ganham uma profundidade quando você sabe que são limitados.
Como transformar a morte em conselheira diária
Deixe-me compartilhar uma prática simples que os filósofos estoicos utilizavam há séculos e que você pode implementar na sua rotina: a Pergunta Matinal.
Toda manhã, pergunte a si mesmo: “Se este fosse meu último dia, eu me sentiria em paz com a forma como pretendo vivê-lo?”
Não se trata de fazer mudanças drásticas ou pedir demissão amanhã. Trata-se de pequenas escolhas diárias que, somadas, constituem uma vida bem vivida. Isso pode significar:
– Dizer às pessoas que você ama o quanto elas importam, antes de sair para o trabalho
– Ouvir genuinamente quando um amigo compartilha suas preocupações
– Dedicar 30 minutos àquele projeto dos seus sonhos que você vem adiando
– Marcar aquela consulta médica que você tem procrastinado
Meu amigo que partiu não sabia que seu tempo acabaria tão cedo. Nenhum de nós sabe.
Mas ele viveu de uma forma que deixou poucas pendências. Ele não teve uma vida perfeita, ninguém tem, mas viveu autenticamente, seguindo seus valores e se aventurando pela vida.
A ciência por trás da consciência da morte
Esta não é apenas uma filosofia antiga. Pesquisas modernas em psicologia confirmam seu poder.
Um estudo de 2017 da Universidade de Kentucky mostrou que pessoas regularmente expostas a lembretes sutis sobre mortalidade reportaram níveis mais altos de gratidão, maior satisfação com a vida e tomavam decisões mais alinhadas com seus valores profundos.
Outro estudo publicado no Journal of Positive Psychology em 2019 descobriu que participantes que praticaram reflexões estruturadas sobre a finitude por apenas 15 minutos, três vezes por semana, durante um mês, demonstraram redução significativa de ansiedade e aumento de comportamentos pró-sociais, como voluntariado e doações para caridade.
O neurocientista David Eagleman explica que nosso cérebro está programado para buscar novidades e ignorar o familiar.
Por isso, sem lembretes conscientes sobre nossa mortalidade, caímos no piloto automático, vivendo dias repetitivos sem realmente experimentá-los.
A prática do Memento Mori interrompe esse padrão, ativando nosso sistema de alerta e tornando o momento presente mais vívido e significativo.
Transformando consciência em ação concreta
O poder desta filosofia está em transformá-la em comportamentos específicos, não apenas em reflexões ocasionais.
Aqui estão cinco práticas concretas para implementar ainda esta semana:
- A Carta Final: Dedique 30 minutos para escrever uma carta como se fosse seu último dia de vida. O que você diria às pessoas que ama? Quais conselhos deixaria? Quais arrependimentos expressaria? Não precisa enviar a carta, o exercício é para clarificar o que realmente importa para você.
- Auditoria de Tempo: Por três dias, anote como gasta cada hora. No quarto dia, revise e pergunte-se: “Se eu soubesse que tenho apenas um ano de vida, continuaria gastando meu tempo desta forma?” Identifique pelo menos três atividades para eliminar e três para aumentar.
- A Conversa Adiada: Identifique uma conversa importante que você tem evitado. Marque-a no calendário para os próximos sete dias. Prepare-se mentalmente, mas não a adie novamente. Seja a reconciliação com um familiar, uma conversa difícil com seu chefe, ou expressar sentimentos não ditos a alguém especial.
- 4. O Projeto Legado: Escolha um projeto pessoal que você sempre quis realizar e que poderia beneficiar outras pessoas mesmo após sua partida. Pode ser escrever um livro de receitas de família, criar um jardim comunitário, ou iniciar um fundo de educação para seus sobrinhos. Dedique 2 horas por semana a este projeto.
- O Ritual de Gratidão Diária: Antes de dormir, liste três experiências específicas do dia que você não teria se não estivesse vivo. Não apenas “minha família”, mas “o abraço apertado da minha filha quando cheguei em casa” ou “a risada do meu parceiro durante o jantar quando contei aquela piada ruim”.
O paradoxo libertador da mortalidade
Pode parecer contraditório, mas aceitar nossa finitude não traz depressão, traz liberdade.
Quando você realmente entende que seu tempo é limitado, para de desperdiçá-lo tentando impressionar pessoas que não se importam.
Para de adiar sonhos por medo do fracasso. Para de tolerar relacionamentos tóxicos por medo da solidão.
Como escreveu o psicólogo irvin Yalom: “Embora a consciência física da morte possa nos aterrorizar, a ideia da morte pode nos salvar.” Ela nos salva da trivialidade. Da superficialidade. Da vida adiada.
A morte é certa. O tempo é limitado. Mas isso, em vez de nos paralisar, pode ser o combustível mais poderoso para uma vida vivida plenamente, hoje mesmo, não em algum futuro hipotético.
Prática estoica de hoje
Lembrete Matinal: Comece com um breve momento de reflexão. Pergunte a si mesmo: “Se hoje fosse meu último dia, eu estaria satisfeito com a forma como estou escolhendo vivê-lo?” Defina uma intenção significativa baseada nessa reflexão.
Concentre-se no que importa: Ao longo do dia, use a consciência da finitude como guia para priorizar o que é verdadeiramente significativo. Evite a rolagem sem propósito nas telas ou distrações triviais, e envolva-se em atividades que ressoem com seus valores essenciais.
A Pergunta dos Cinco Anos: Quando enfrentar decisões hoje, pare e pergunte-se: “Isso fará diferença daqui a cinco anos?” Deixe que essa pergunta o guie em direção a escolhas que tragam satisfação duradoura.
Conexão com o Legado: Antes de dormir, anote um pequeno passo que você deu hoje que se alinha com a forma como você gostaria de ser lembrado. Reconheça o impacto dessas escolhas diárias no panorama maior da sua vida.
Prática de gratidão: Encerre o dia reconhecendo três coisas pelas quais você é grato, cultivando uma apreciação mais profunda pelo momento presente.
O que aprendi desde a perda do meu amigo é que a melhor maneira de honrar aqueles que partiram é viver plenamente enquanto podemos. Não no próximo ano. Não quando estivermos “prontos”. Agora.
Porque a verdade é que não sabemos se teremos amanhã. Mas temos o agora. Este momento. E em homenagem a todos aqueles que partiram cedo demais, vamos fazer valer a pena.
Viva com coragem. Ame abertamente. Perdoe rapidamente. E nunca, jamais guarde sua alegria para depois.
Você não sabe quanto tempo tem. Eu também não. Mas podemos escolher como usar o tempo que nos resta.
Que tal começar hoje?
Com sabedoria, coragem e clareza,
Railka Wan Der Maas